terça-feira, 8 de novembro de 2011

A carne branca é uma grande ilusão

“É sempre possível acordar alguém que esteja dormindo, mas barulho algum vai acordar alguém que finja dormir.”
Jonathan Safran-Foer


Desde 2005, quando participei da fundação do primeiro grupo gaúcho da Sociedade VegetarianaBrasileira, já conversei com centenas de pessoas no nosso estande, por internet e em eventos. Nessas conversas foi possível destacar uma série de mitos sobre vegetarianismo que ainda estão entranhados no pensamento de muita gente. Alguns dizem respeito à ingestão de proteína (“mas de onde você tira sua proteína?”), à suposta sensibilidade das plantas (“mas o tomate também sente dor”), à criação de crianças vegetarianas (“respeito sua opção, mas não queira forçar os seus filhos!”),  e a muitas outras opiniões cambaleantes transformadas em fatos incontestáveis. A maioria dessas ideias obtusas vai aos poucos dando lugar à informação bem fundamentada e ao bom senso. Mas um dos mitos permanece, sempre forte, o da carne branca.
 
Como todo mito, este nasce da desinformação, que gera a presunção de uma verdade que, por fim, leva a uma total falta de questionamento. Mas vamos a ele. O mito da carne branca é um pouco mais difuso e menos objetivo que os outros mitos, mas pode ser simplificado assim: “o problema mesmo é a carne vermelha, portanto, se eu consumir apenas carne branca já estarei fazendo minha parte”. Esse é apenas um dos lados, há outros ainda, como “carne branca é mais saudável” ou “a galinha foi feita pra isso mesmo”.

Ao contrário de outros argumentos de onívoros, muitas vezes usados somente com intenção de provocar e confundir, por vezes numa atitude defensiva tão forte que mereceria a opinião de um daqueles psicanalistas de programas televisivos, o mito da carne branca é preocupante pois parte, invariavelmente, de pessoas bem-intencionadas.  E sua avó já lhe ensinava: “de boas intenções...”

Nos eventos em que mencionei anteriormente, as pessoas me vem revelar com indisfarçável orgulho a sua opção pela carne branca. “É um absurdo o que fazem com os animais, né? Eu só como carne branca”, me disse um senhor. Um casal jovem, sorridente,  me abordou outro dia, “Lá em casa a gente já aboliu a carne vermelha, agora só peixe e um franguinho.”  Uma vizinha: “Também sou vegetariana! Só como galinha caipira.” Uma prima já está há uns oito anos, segundo ela, “quase vegetariana”. Sim, você adivinhou, no Natal ela se esbalda com o peru, afinal, é  carne branca... Eu poderia encher algumas páginas (e também a sua paciência) com esses diálogos reveladores. Confesso que quero ficar comovido com esses depoimentos, pois entendo  que esse povo todo está sim fazendo um grande esforço alterando seus hábitos alimentares. Parecem estar em busca de aprovação, querem acreditar que chegaram lá, que fizeram a sua parte, acredite, seus olhos brilham quando pronunciam aquelas frases. Mas, tal como em Matrix, lhes dou a opção da pílula vermelha.

Se tivesse que recomendar apenas um tipo de animal para você comer (o que eu jamais faria), o último deles seria o frango. O frango é sem dúvida o que mais sofre durante todo o processo de criação até o abate. Para começar, não há nada de natural na criação desses animais, que já nascem condenados: desde filhotes têm seus bicos cortados com uma lâmina quente; como são selecionados aqueles que dão mais carne, têm estrutura óssea incompatível com seu peso, o que gera deformidades internas e externas; jamais chegam a ver a luz do dia, ficando confinados em espaços equivalentes à meia página de um jornal, e suas patas nunca sentem o chão, apenas grades. Os que não acabam por morrer asfixiados durante o transporte, quando são encaixotados aos milhares em caminhões, são escaldados vivos e sangrados até a morte. E vou me abster de detalhar a “vida” das galinhas poedeiras. Galinhas e frangos são os animais de criação abatidos com o mais curto período de vida.

De onde surgiu o mito da carne branca ainda não sei. Mas, como diz o Dr. Marcio Bontempo, “A carne branca é uma grande ilusão. A carne branca é bicho, é animal também”. É perfeitamente compreensível que a eliminação da carne branca da sua dieta seja apenas uma etapa de um (desnecessariamente) lento processo que objetiva o vegetarianismo. Mas, se você cortou a carne branca pensando nos animais, pense de novo.

Diego Lopes

2 comentários:

  1. O mito da carne branca vem da questão da alimentação saudável, já que teoricamente as carnes brancas são mais leves, possuem menos colesterol e o peixe tem ômega 3. Além disso, o consumo de carne vermelha tem ligação com câncer de intestino e com altos níveis de colesterol no sangue. Por causa disso, as pessoas ouvem falar por aí que elas devem comer carnes brancas (principalmente quem quer emagrecer) e fora que qualquer nutricionista não vegetariano aconselha comer peixe por causa do ômega 3 ou frango grelhado. Talvez pelo fato do vegetarianismo ser tão ligado à alimentação saudável e equilibrada, o povo mistura esas indicações (de comer carne branca) com o vegetarianismo, só que esquecem do fato que vegetariano não come carne, qualquer tipo de carne.
    Tem outro ponto: na prática, é comum dizer "carne" se referindo à carne vermelha, e frango e peixe chamar de frango e peixe. Daí que a grande parte das pessoas confunde o fato de vegetariano não comer carne, pois acham que carne é só carne vermelha.
    Talvez essas pessoas que trocam ou misturam os conceitos leem pouco, buscam pouco sobre o assunto (vegetarianismo e alimentação saudável), pois qualquer um que tenha interesse no assunto e busca se aprofundar o mínimo que seja, acha informações. Ou seja, a informação está disponível, basta as pessoas quererem ver.

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  2. Sim, é verdade, todas as considerações que fizeste explicam suas origens e também contribuem para a manutenção desse mito.
    abç

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